Helene Sacco é artista e professora na área da escultura e desenho na UFPel e participa da exposição Três Estações, no Atelier Subterrânea, até o dia 6 de setembro. No dia 20 de julho, às 16h, ela participa de um bate-papo no Atelier com os outros artistas da exposição.

Os trabalhos que tu estás apresentando em Três Estações fazem parte de alguma série?
Sim, é um conjunto. Nos meus trabalhos antigos, na pesquisa de doutorado, eu tinha uma coleção de fotografias de casas que são levadas em caminhões. O pessoal arranca a casa do chão e leva para outro lugar. A coleção tem mais de 200 imagens. No ano passado, eu expus uma parte dessa coleção no MARGS, e eu chamei de “Lugar Nenhum: marcas para um ponto príncipe” porque sempre tem uma questão de observação do lugar. Para que o lugar não seja lugar nenhum, há sempre uma tentativa de uma criação de um tempo com as coisas, com os objetos, com a paisagem, com uma espera. Essa coleção e esse trabalho me exigiram, eu senti e a necessidade de inventar esse Lugar Nenhum.

Foto Flickr MARGS

E aí eu pensava que esse lugar poderia ser em qualquer lugar, mas me perguntava de que forma eu poderia contar isso como uma narrativa mesmo ficcional, mas com uma veracidade, ter essa fabulação mas uma relação com a realidade. Então – já um procedimento meu, de interesse particular – fui atrás de uma forma de representação do mundo através do desenho. Eu gosto muito daquelas enciclopédias do século 19 início do século 20 – bem nessa passagem quando a fotografia não ocupava o espaço das revistas, dos jornais. E é fascinante. É outra forma de contar o mundo. Por exemplo, um designer precisava vender um fogão a lenha e dizer que ele ia durar pra vida toda. Então tem um fogão e a menina nascendo. Depois, ela já com 8 anos, ela moça bonita, ela casando, e depois uma caveira do lado! [risos] Então tinha uma outra forma de fazer isso. Eu comecei a ficar encantada com esses desenhos. Para aquela época tinha toda uma forma didática de contar o mundo.

Crédito da artista

Esses desenhos tracejados, reais, muitos próximos da realidade. Então estes desenhos, desta enciclopédia, que são desse tipo, eles falam desta realidade mas uma realidade outra, porque não é real. Folheando ela eu encontrei estas imagens [acima]. A gente pensa como é possível isso. Não é uma crítica aos desenhos, pelo contrário, é fascinante. É aproveitar coisas do desenho para criar um mundo outro. Eu vi que há o mesmo movimento meu com objetos, porque eu me aproprio dos objetos, eu desconstruo eles e eles sempre têm uma outra função, nunca é a original. Então, por exemplo, a máquina de costura vira uma pia e escrivaninha.

Como se fosse uma ressignificação?
Exato. Acabei usando esse mesmo procedimento dos objetos com os desenhos e aí criei em cada um destes desenhos dos continentes uma placa para o Lugar Nenhum, dando essa possibilidade de que ali se constrói o Lugar Nenhum. Então eu fiz uma placa taxonômica também relacionando com a perspectiva e com os planos dos outros, e já dando uma explicação, abordando um pouco o funcionamento desse lugar. Eu coloquei também os objetos que eu crio do Lugar Nenhum neste desenho. Então tem a escrivaninha, a objetoteca, tem a hora nômade, tem o observador.

E quando a questão da literatura entrou na tua produção?
Já desde o início da minha carreira, como eu partia sempre de um objeto para que ele se tornasse meu, era quase como se eu tivesse que criar alguma coisa sobre ele, para ele deixar de ser do outro. Então, quando eles vão lá pra casa, eles passam um bom tempo no atelier isolados. Mas, também, era sempre a partir de um conto que eu inventava os objetos, tem sempre tem uma ficionalização. E claro, tenho muitas influências. Por exemplo, como eu trabalho com inventário, o Perec é uma influência super importante. O Borges com essa questão dos seres impossíveis… e até acho que foi o Borges que falou que as listas e os inventários criam um mundo que só é possível ali. Não existiria outra forma. Eu participo também do doutorando no Instituto de Artes da UFRGS e sou doutoranda da Élida, então temos um grupo que estuda essa parte escrita, essa ligação entre arte e literatura.

E os carimbos, como se encaixam nisso tudo?
Os carimbos começaram em um trabalho que eu fiz para a Bienal, em que eu criei um gabinete. Era um trabalho na vitrine da Casa M, e era um gabinete de desenho. Eu criei um carimbo grande que era o desenho daquele gabinete. E aí comecei a fazer um carimbo para todo lugar que eu invento. E isso vem da ciência né, tu fazes uma classificação e aí tu carimba o ano a data, etc. Uma ordem bem científica. E agora eu uso carimbos para todos os trabalhos, nem que sejam para caixas. Tem uns trabalhos que eu faço em caixas, e aí nem que seja para carimbar a tampa. Vira uma marca do lugar.

Fotos Anderson Astor

 

Crédito da artista

 

Veja os trabalhos de Helene Sacco na Subterrânea até o dia 6 de setembro, na exposição Três Estações.

De segunda a sexta, das 14h às 18h